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Excelência em Licitações!

Por: Marcela Oliveira[1]

Supervisão: Felipe Ansaloni[2]

 

I – Introdução

            As Microempresas e Empresas de Pequeno Porte vem se destacando progressivamente no cenário econômico brasileiro, sobretudo no âmbito das licitações públicas.

            A Lei Complementar nº 123/2006 introduziu vantagens e benefícios às ME’s e EPP”s, que, de certa forma, estimulam aos empresários desse segmento a participarem de processos licitatórios para vender ou prestar serviços ao Governo.

            Um desses benefícios, que será debatido neste artigo é a chamada reserva de cotas, segundo a qual a Administração Pública deverá estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a disputa exclusiva entre microempresas e empresas de pequeno porte.

            Sabe-se que as licitações realizadas pelos Consórcios Públicos se destinam a atender vários entes, o que muitas vezes, resulta em processos de valores estimados vultuosos e um grande quantitativo de itens. Logo, a reserva de cotas para ME’s ou EPP’s pode não ser vantajosa para os Consórcios Públicos?

Caso não haja vantajosidade, os Consórcios Públicos podem deixar de fazer a reserva de cotas para ME’s ou EPP’s em seus editais de licitação? O que orienta a Nova Lei de Licitações e a Jurisprudência?

II – Os Consórcios Públicos Podem Não Reservar Cotas para ME’s ou EPP’s em Licitações? E Se Não for Vantajoso?

 

            O tratamento diferenciado e favorecido às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte tem previsão na Constituição Federal (arts. 70, IX[3] e 179[4]) e possui como uma das finalidades o incentivo à atuação no mercado.

            A Lei Complementar nº 147/2014 que alterou a Lei Complementar nº 123/2006, regula o tratamento diferenciado e simplificado para as ME’s e EPP’s no âmbito das compras públicas.  De acordo com os arts. 47 e 48:

Art. 47.  Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica.

Parágrafo único.  No que diz respeito às compras públicas, enquanto não sobrevier legislação estadual, municipal ou regulamento específico de cada órgão mais favorável à microempresa e empresa de pequeno porte, aplica-se a legislação federal.”

Art. 48.  Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública:

I – deverá realizar processo licitatório destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);

II – poderá, em relação aos processos licitatórios destinados à aquisição de obras e serviços, exigir dos licitantes a subcontratação de microempresa ou empresa de pequeno porte;

III – deverá estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte.

  • 3oOs benefícios referidos no caput deste artigo poderão, justificadamente, estabelecer a prioridade de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte sediadas local ou regionalmente, até o limite de 10% (dez por cento) do melhor preço válido.” (grifo nosso)

            À luz dessa perspectiva, destaca-se que a reserva de cotas deve referir-se aos bens de natureza divisível, que podem ser adquiridos separadamente (licitação por item) sem que isso afete o resultado ou a qualidade final do produto ou serviço.

            Nessa senda, se o consórcio público estiver licitando bens de natureza divisível, deverá reservar uma cota de até 25% (vinte e cinco por cento) para a contratação de ME’s e EPP’s.

            Em contraste a isso, caso o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não seja vantajoso para a Administração Pública ou represente prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a ser contratado, a reserva de cotas não será aplicada, segundo o art. 49, III da Lei Complementar 123/2006.

            Importante mencionar que a Nova Lei de Licitações recepciona as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar 123/2006, em seu art. 4º[5].

            O Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, por meio do Acórdão 00576-2024-5 – Plenário decidiu como irregular a não observância da reserva de cota prevista na Lei Complementar 123/2006, por um Consórcio Público Capixaba:

REPRESENTAÇÃO – PREGÃO ELETRÔNICO – REGISTO DE PREÇOS – CONSÓRCIO PÚBLICO – CONTRATAÇÃO DE EMPRESA ESPECIALIZADA PARA O FORNECIMENTO DE ARTEFATOS DE MOBÍLIA OFFICE – JULGAR PROCEDENTE – APLICAR MULTA – DAR CIÊNCIA – ARQUIVAR.

“Incorre, mais uma vez o responsável na falta de descrição no processo original dos motivos que determinaram a escolha da administração em praticar o ato administrativo. O pressuposto de direito é a lei que baseia o ato administrativo, ao passo que o pressuposto de fato corresponde as circunstâncias, situações, acontecimentos, que levam a Administração a praticar o ato (…) Assim, inexiste motivo para afastar a irregularidade (b) não observância da reserva de cota prevista da LC 123/2006. Mantenho, portanto, a irregularidade”.

(Acórdão 00576-2024-5 – Plenário – Processos: 03071/2023-1, 03075/2023-1 – Classificação: Controle Externo, Fiscalização, Representação – Relator: Savi Diniz de Carvalho – Data da sessão: 13/06/2024 – 28ª Sessão Ordinária do Plenário) (grifo nosso)

            Pela síntese da Jurisprudência e levando em conta o comando do art. 49, III da Lei Complementar 123/2006, pode-se compreender que a excepcionalidade da reserva de cotas às ME’s e EPP’s, quando não houver vantagem para a Administração Pública, deve ser precedida de um estudo prévio a ser justificada nos autos: “Ocorre que, não basta para fundamentar os atos administrativos a simples referência de um artigo se contrapondo ao outro. É fundamental a demonstração nos autos do procedimento licitatório das razões que fundamentaram a não fixação da cota exclusiva em percentual de 25% (vinte e cinco por cento), não bastando a simples indicação de que a situação de enquadra em uma das exceções à aplicação da reserva.

III – Recomendações do TCE/ES aos Consórcios Públicos:

  • O TCE/ES recomenda aos Consórcios Públicos que observem a reserva de cotas exclusivas em licitações para micro e pequenas empresas;
  • O Consórcio Público deve realizar um estudo prévio para auferir se haverá ou não vantajosidade na reserva de cotas exclusivas para micro e pequenas empresas.

IV – Recomendações da 11E aos Empresários:

 

  • A 11E recomenda aos empresários que se enquadram como ME’s e EPP’s que verifiquem se o edital reservou cotas exclusivas para os pequenos negócios. Caso contrário, é possível impugnar o instrumento convocatório.

V – Comentários do Professor Felipe Ansaloni

  • As cotas reservadas em licitações para os pequenos negócios são um mecanismo fundamental para o desenvolvimento sustentável dos pequenos negócios, por meio da utilização do Poder de Compra Estatal. Trata-se de um dever inafastável, inclusive para Consórcios Públicos, pois, há de se lembrar, o fundamento do tratamento jurídico e diferenciado aos pequenos negócios decorre da própria Constituição Federal.

VI – Conclusão

Em conclusão, a reserva de cotas exclusivas para micro e pequenas empresas é a regra geral e essa deve ser fielmente observada por todos os órgãos da Administração Pública, inclusive por Consórcios Públicos. Excepcionalmente, os consórcios podem deixar de observar a reserva de cotas, desde que tenha sido realizado um robusto estudo prévio que fundamente a decisão nos autos do processo licitatório. Ainda sim, há de se relembrar que o fundamento para a reserva de cotas em licitações em favor dos pequenos negócios, decorre do próprio texto Constitucional. Por isso, a priori, a reserva de cotas para as MPE’s deve sempre ser observada.

VII – Como citar este texto

 

BARBOSA, Felipe José Ansaloni. OLIVEIRA, Marcela de Sousa. Os Consórcios Públicos Podem Deixar de Fazer Reserva de Cotas para ME’s ou EPP’s Quando Não For Vantajoso? 2024. Disponível em: www.11E.com.br.

[1] Analista da 11E Licitações.

[2] CEO e Professor da 11E Licitações.

[3] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)

 

[4] Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.

[5] Art. 4º Aplicam-se às licitações e contratos disciplinados por esta Lei as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

 

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