NAS LICITAÇÕES PARA AQUISIÇÕES DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS E PRODUTOS CÁRNEOS É RECOMENDÁVEL A EXIGÊNCIA DE ALVARÁ SANITÁRIO, PELO ÓRGÃO PÚBLICO, NO ROL DE DOCUMENTOS DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA?
- 2 de agosto de 2024
- Posted by: fcbrant
- Category: Coluna da Semana
Por: Giuliano Antônio Silva
Thaís Dias Oliveira
- INTRODUÇÃO:
Nesse artigo será discutido sobre a possibilidade de exigência do Alvará Sanitário, pelos órgãos públicos, no rol de documentos de qualificação técnica, nos certames licitatórios, quando o objeto se trata de gêneros alimentícios e produtos cárneos.
O que diz a Nova Lei de Licitações? Como a jurisprudência se posiciona sobre esse assunto?
- É recomendável a exigência de alvará sanitário pelo órgão público, no rol de documentos de qualificação técnica, em licitações para aquisições de gêneros alimentícios e produtos cárneos?
Antes de adentrarmos no tema, convém relembrarmos que, um dos objetivos do processo licitatório é assegurar o tratamento isonômico entre os participantes e a justa competição [1], sendo vedado à Administração incluir cláusulas em seus certames licitatórios que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo do processo[2].
Assim, a Administração Pública deve incluir nos seus editais, somente as comprovações mínimas de que o interessado tem condições de executar o serviço ou ofertar o bem, afastando exigências inúteis ou desnecessárias.
Por outro lado, a Administração Pública também deve verificar se o licitante que será contratado reúne as aptidões técnicas para executar o objeto de forma satisfatória. Por meio do exame da qualificação técnica, a Administração Pública consegue auferir se a empresa que está participando do processo licitatório possui condições que evidenciam sua capacidade para executar o objeto licitado.
Nesse sentido, dentre os documentos de qualificação técnica, exigidos no art. 67 da Lei nº 14.133/2021, temos o constante no inciso IV [3], o qual faz menção a requisitos previstos em lei especial, quando for o caso.
Em se tratando especificamente da situação fática aqui discutida, qual seja, a aquisição de gêneros alimentícios e produtos cárneos, o alvará sanitário é considerado um requisito previsto em lei especial, e, portanto, deve ser exigido.
Vamos elucidar melhor a questão.
O Alvará sanitário emitido pelo órgão da vigilância local é um documento técnico essencial, que toda e qualquer empresa que atue no ramo de atividade de distribuição e comercialização de gêneros alimentícios deve possuir, não podendo o órgão público estabelecer quaisquer exceções para tal, quando da elaboração de seu instrumento convocatório.
Isto porque segundo os artigos 45 e 46 do Decreto-Lei n.º 986/69, de abrangência nacional, o qual institui normas básicas sobre alimentos, há a obrigatoriedade de as empresas que atuam nesse segmento possuírem o Alvará Sanitário para o exercício de suas atividades. Veja:
“Art. 45. As instalações e o funcionamento dos estabelecimentos industriais ou comerciais, onde se fabrique, prepare, beneficie, acondicione, transporte, venda ou deposite alimento ficam submetidos às exigências deste Decreto-lei e de seus Regulamentos.
Art. 46. Os estabelecimentos a que se refere o artigo anterior devem ser previamente licenciados pela autoridade sanitária competente estadual, municipal, territorial ou do Distrito Federal, mediante a expedição do respectivo alvará.” (grifo nosso)
Na mesma linha, a Resolução SES/MG nº 7.426, de 25 de fevereiro de 2021, a qual estabelece as regras do licenciamento sanitário e os prazos para resposta aos requerimentos de liberação de atividade econômica, no âmbito da Vigilância Sanitária do Estado de Minas Gerais, CONSIDERANDO ESPECIFICAMENTE O OBJETO DA LICITAÇÃO EM QUESTÃO, estabelece em seu Anexo I (ATIVIDADES ECONÔMICAS CLASSIFICADAS COMO NÍVEL DE RISCO II PARA FINALIDADE DE LICENCIAMENTO SANITÁRIO) que AS EMPRESAS QUE ATUAM NESSE SEGMENTO ESTÃO CLASSIFICADAS NO ‘NÍVEL DE RISCO II’ conforme o critério de ‘Classificação de Risco’, que pode ser facilmente consultado pelo link [4].
Além do mais, nos termos do inciso II do art. 4º da mesma Resolução SES/MG nº 7.426, de 25 de fevereiro de 2021, tem-se que AS EMPRESAS QUE SE ENQUADRAM NO ‘NÍVEL DE RISCO II’, PARA O EXERCÍCIO DE SUAS ATIVIDADES, É OBRIGATÓRIA A OBTENÇÃO DE LICENCIAMENTO SANITÁRIO SIMPLIFICADO PELO ÓRGÃO COMPETENTE, O QUE NÃO SE CONFUNDE, EM HIPÓTESE ALGUMA, COM A DISPENSA DE ALVARÁ SANITÁRIO, Veja:
“Art. 4º – Para fins de licenciamento sanitário, adota-se a seguinte classificação do nível de risco das atividades econômicas:
I – Nível de Risco I (também denominado Baixo Risco A; ou Risco Leve, Irrelevante ou Inexistente): atividades econômicas cujo início do funcionamento da empresa ocorrerá sem a realização de inspeção sanitária prévia e sem emissão de licenciamento sanitário, ficando sujeitas à fiscalização posterior do funcionamento da empresa e do exercício da atividade econômica;
II – Nível de Risco II (também denominado Baixo Risco B; Médio Risco; ou Risco Moderado): atividades econômicas que comportam inspeção sanitária posterior ao início do funcionamento da empresa, SENDO QUE PARA O EXERCÍCIO DESSAS ATIVIDADES SERÁ EMITIDO LICENCIAMENTO SANITÁRIO SIMPLIFICADO PELO ÓRGÃO COMPETENTE; e
III – Nível de Risco III (também denominado Alto Risco): atividades econômicas que exigem licenciamento sanitário com análise documental e inspeção sanitária prévia ao início do funcionamento da empresa.” (grifamos)
Nesta toada, é entendimento pacificado no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais que já se posicionou acerca da exigência de alvará sanitário, em decorrência das atividades:
“DENÚNCIA. PREGÃO PRESENCIAL. REGISTRO DE PREÇOS. EXIGÊNCIA DE ALVARÁ SANITÁRIO. PERTINÊNCIA COM O OBJETO A SER CONTRATADO. LICITUDE. PRAZO PARA REGULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO FISCAL DAS MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE. ART. 43, §1º, DA LEI COMPLEMENTAR N. 123/06. INOBSERVÂNCIA. APLICAÇÃO DE MULTA. RECOMENDAÇÃO. 1. Não configura irregularidade a exigência de apresentação, pelos licitantes, de alvará sanitário na fase de habilitação, quando pertinente ao objeto do certame.2. É passível de multa a inobservância, pela autoridade condutora do certame, da prerrogativa prevista no art. 43, §1°, da Lei Complementar n. 123/06, o qual determina a concessão, às microempresas e empresas de pequeno porte que participem de licitações, de prazo dilatado para regularização de eventuais restrições nos documentos apresentados para comprovação da regularidade fiscal.3. No art. 26 da Lei n. 8.666/93 não se estabelece a forma como a Administração deve formalizar a razão da escolha do fornecedor ou a justificativa de preços, portanto, embora não tenha sido juntado ao procedimento de dispensa documento denominado “justificativa de preço e razão da escolha do fornecedor”, a pesquisa de preços apresentada pode ser acolhida como justificativa dos preços contratados e a razão da escolha pelo melhor preço apurado. [DENÚNCIA n. 932820. Rel. CONS. SUBST. HAMILTON COELHO. Sessão do dia 19/02/2019. Disponibilizada no DOC do dia 20/03/2019. Colegiado. PRIMEIRA CÂMARA.]” (grifamos)
- CONCLUSÃO
Portanto, quando se está diante de licitação cujo objeto é a aquisição de gêneros alimentícios e produtos cárneos, não deve o edital de licitação, ESTABELECER QUALQUER EXCEÇÃO OU POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE APRESENTAÇÃO DO ALVARÁ SANITÁRIO PELAS LICITANTES.
Isso porque, o órgão público, tem por OBRIGAÇÃO E DEVER EXIGIR DAS LICITANTES O ALVARÁ SANITÁRIO, pois se trata de CONDIÇÃO NECESSÁRIA E OBRIGATÓRIA DE TODA E QUALQUER EMPRESA QUE ATUE NESTE SEGMENTO.
Sobre os autores:
Giuliano Antônio Silva
Advogado, pós-graduado em Direito Público pela FADOM e em Planejamento Orçamentário e Financeiro do SUS Municipal pela PUC/MG. Atualmente, é pós-graduando em Gestão Pública pela UEMG. Atua como pregoeiro e procurador do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Região do Vale do Itapecerica (CISVI). Sócio do escritório RG Advogados Associados e Consultor Sênior na 11E Licitações e Contratos. Coautor do artigo “Estudos de caso das experiências em Compras Centralizadas nos Consórcios Públicos Intermunicipais de Saúde: CISVI e CISTM”, no livro Compras Públicas Centralizadas no Brasil: Teoria, Prática e Perspectivas.
Thaís Dias Oliveira
Advogada com mais de 10 anos de experiência na administração pública, especializada em assessoria jurídica em processos licitatórios. Pós-graduanda em Licitações e Contratos pela Escola Mineira de Direito (EMD), possui pós-graduação em Direito Público Contemporâneo pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e graduação em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Instituto Vianna Júnior. Atua como Procuradora Municipal na Prefeitura de Piraúba (MG) e é Consultora Sênior na 11E Licitações, além de prestar consultoria para empresas privadas.
[1] Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:
[…]
II – assegurar tratamento isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;
[2] Art. 9º É vedado ao agente público designado para atuar na área de licitações e contratos, ressalvados os casos previstos em lei:
I – admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos que praticar, situações que:
- a) comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo do processo licitatório, inclusive nos casos de participação de sociedades cooperativas;
- b) estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou do domicílio dos licitantes;
- c) sejam impertinentes ou irrelevantes para o objeto específico do contrato;
[3] Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a:
[…]
IV – prova do atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso;