Por: Marcela Oliveira[1]
Supervisão: Felipe Ansaloni[2]
I – Introdução
Os Conselhos de Fiscalização Profissional, enquanto autarquias federais de regime especial, estão vinculados aos princípios constitucionais da Administração Pública, entre eles a publicidade e a transparência.
Uma dúvida frequente entre gestores de Conselhos Profissionais e empresários que interagem com essas entidades é se há a obrigatoriedade de publicar os atos de dispensa e inexigibilidade de licitação.
A jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU), como a expressa no Acórdão 6633/2018 – Primeira Câmara – Relator Augusto Sherman, e as disposições da Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) oferecem respostas claras a essa questão.
Este artigo visa analisar essa obrigatoriedade, direcionando informações relevantes para ambos os públicos.
II – Conselhos Profissionais Devem Publicar Atos de Dispensa e Inexigibilidade de Licitação?
Os Conselhos de fiscalização profissional, apesar de sua natureza jurídica sui generis, exercem função pública e administram recursos parafiscais. Por isso, submetem-se às normas de direito público, inclusive no que diz respeito à realização de licitações e contratações.
A decisão do TCU no Acórdão 6633/2018 – Primeira Câmara – Relator Augusto Sherman é emblemática ao rejeitar as justificativas de um Conselho de Fiscalização Profissional que não publicou, na imprensa oficial, os atos de dispensa de licitação para a aquisição de um imóvel:
“REPRESENTAÇÃO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. CONTRATAÇÃO DIRETA POR INEXIGIBILIDADE SEM COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS SEM PROCESSO SELETIVO. CONHECIMENTO. REJEIÇÃO DAS RAZÕES DE JUSTIFICATIVA. MULTA. DETERMINAÇÕES. A ausência de publicação, na imprensa oficial, dos atos da dispensa da licitação para a aquisição de imóvel, com fundamento no art. 24, inciso X da lei 8.666/1993 viola o disposto no art. 26 da lei 8.666/1993, devendo a unidade não apenas providenciar tal publicação, em situações de dispensa, mas também fazer inserir no processo a comprovação de tal publicação, para fins de registro, transparência e controle”
(ACÓRDÃO 6633/2018 – PRIMEIRA CÂMARA – RELATOR: AUGUSTO SHERMAN – PROCESSO: 006.639/2017-8 launch – TIPO DE PROCESSO: REPRESENTAÇÃO (REPR) – DATA DA SESSÃO: 11/07/2018 – NÚMERO DA ATA: 23/2018 – Primeira Câmara)
O fundamento da decisão reside na violação do artigo 26 da Lei nº 8.666/93, que exige a publicação dos atos de dispensa e inexigibilidade na imprensa oficial. O TCU enfatizou que essa publicação é essencial para garantir o registro, a transparência e o controle dos atos administrativos, mesmo em situações de dispensa de licitação.
Essa jurisprudência demonstra a firme posição do TCU quanto à necessidade de dar publicidade aos atos de contratação direta. A ausência de publicação impede o conhecimento público das decisões administrativas, dificultando o exercício do controle social e dos órgãos de controle.
A Lei nº 14.133/2021 reforça o princípio da transparência em todas as etapas do processo de contratação pública. Embora não haja um artigo específico que reproduza literalmente o artigo 26 da Lei nº 8.666/93, a nova legislação estabelece diversas disposições que corroboram a obrigatoriedade de publicação dos atos de dispensa e inexigibilidade.
O art. 72, parágrafo único[3] da Lei nº 14.133/2021 exige que a decisão que declara a dispensa, quando cabível, seja instruída com documentos comprobatórios da situação fática que fundamenta a dispensa e, se for o caso, parecer jurídico e pareceres técnicos pertinentes. Essa documentação, por sua natureza, deve ser acessível ao público. Esta exigência representa uma evolução em relação à lei anterior, reforçando a transparência ativa.
Ademais, o artigo 94[4] da Nova Lei de Licitações detalha os requisitos de transparência que devem ser observados, incluindo a divulgação em sítio eletrônico oficial, de forma clara e atualizada, de informações como os instrumentos de contrato e seus aditamentos, as atas de registro de preços, os resultados dos processos licitatórios e os documentos relacionados às dispensas e inexigibilidades.
Embora o foco principal seja o sítio eletrônico, a jurisprudência do TCU, ao exigir a publicação na imprensa oficial, demonstra a importância de garantir uma ampla divulgação, alcançando um público mais vasto.
III – Recomendações do TCU aos Conselhos Profissionais:
Para garantir a conformidade e a transparência, recomenda-se aos gestores:
- Observar rigorosamente a necessidade de publicação de todos os atos de dispensa e inexigibilidade no PNCP e, quando possível, em meio oficial como o Diário Oficial.
- Documentar todo o processo de contratação direta, garantindo que os autos contenham:
- Publicação dos atos;
- Justificativa fundamentada;
- Ato de ratificação.
- Inserir no processo administrativo a comprovação da publicação, para atender às exigências de auditoria e controle.
- Realizar seleção pública de pessoal, mesmo que simplificada, em respeito aos princípios da impessoalidade e publicidade.
- Promover treinamentos regulares para equipes de contratação e gestores, a fim de manter a conformidade com a Nova Lei de Licitações.
IV – Recomendações da 11E Licitações aos Empresários:
Para as empresas que desejam contratar com Conselhos Profissionais:
- Verifiquem a regularidade do processo: exijam acesso à documentação que comprova a publicação dos atos de dispensa ou inexigibilidade.
- Acompanhem os Diários Oficiais e o PNCP: as oportunidades de contratação e eventuais irregularidades podem ser identificadas nesses meios.
- Cuidem da qualificação documental: em contratações diretas, comprovem sua notória especialização ou condições que justifiquem a contratação.
- Evitem contratos informais: participar de contratações sem publicação ou sem respaldo formal pode gerar riscos legais e de reputação para a empresa.
V – Comentários do Professor Felipe Ansaloni
A obrigatoriedade de publicação dos atos de dispensa e inexigibilidade de licitação por parte dos Conselhos Profissionais, conforme elucidado pela jurisprudência do TCU e reforçado pela Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), é um pilar fundamental para a transparência e integridade na gestão pública.
Recomendamos aos Conselhos Profissionais que adotem uma postura proativa na divulgação desses atos, utilizando tanto o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) quanto outros meios de ampla divulgação, como o Diário Oficial, para garantir o máximo de transparência e controle social.
Aos empresários, oriento que acompanhem atentamente as publicações dos Conselhos Profissionais e que zelem pela regularidade de suas contratações, verificando a existência da devida publicidade dos atos de dispensa e inexigibilidade. Essa diligência é crucial para a segurança jurídica de seus negócios e para o fortalecimento de um ambiente de contratações públicas íntegro e transparente.
VI – Conclusão
Diante da análise da jurisprudência do TCU e das disposições da Nova Lei de Licitações, a resposta à pergunta central deste artigo é inequívoca: sim, os Conselhos Profissionais devem obrigatoriamente publicar os atos relativos às contratações diretas por dispensa ou inexigibilidade de licitação. Esta obrigação não representa mera formalidade burocrática, mas condição essencial para a validade e eficácia dos atos administrativos praticados.
A publicidade dessas contratações assegura transparência na gestão dos recursos, permite o controle institucional e social, confere segurança jurídica às relações contratuais e, principalmente, demonstra o compromisso da instituição com os princípios constitucionais da Administração Pública.
Os gestores de Conselhos Profissionais devem estar atentos a esta exigência, implementando processos e controles que garantam seu cumprimento, evitando assim responsabilizações pessoais e preservando a regularidade das contratações realizadas. Da mesma forma, empresários que negociam com estas entidades devem conhecer estas exigências e zelar pela regularidade dos processos, como forma de proteger seus próprios interesses e contribuir para a legalidade e transparência na gestão pública.
VII – Como citar este texto
BARBOSA, Felipe José Ansaloni. OLIVEIRA, Marcela de Sousa. Conselhos Profissionais Devem Publicar Atos de Dispensa e Inexigibilidade de Licitação? 2025. Disponível em: www.11E.com.br.
VIII – Palavras-chave
Acórdão 6633/2018, TCU, Licitação, Lei 14133/2021, Contratação pública, Conselho Profissional, Conselhos Profissionais, Contratação Direta, Dispensa de Licitação, Inexigibilidade de Licitação, Publicação de Atos, Transparência Pública
IX – Observação:
Este artigo tem caráter meramente informativo e geral. O seu conteúdo não substitui a consulta a profissionais especializados em Consultoria e Assessoria em Licitações e Contratos Administrativos, especialmente para a avaliação de casos concretos. Recomenda-se que os Conselhos Profissionais busquem orientação jurídica especializada e casuística, antes de realizar qualquer contratação. A 11E Licitações, empresa especializada no segmento de consultoria e treinamentos, pode auxiliar o seu Conselho Profissional. Entre em contato conosco pelo: contato@11e.com.br ou whatsapp: (31) 3568-8311.
[1] Analista da 11E Licitações.
[2] CEO e Professor da 11E Licitações.
[3] Art. 72. O processo de contratação direta, que compreende os casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação, deverá ser instruído com os seguintes documentos:
I – documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;
II – estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei;
III – parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos;
IV – demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido;
V – comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária;
VI – razão da escolha do contratado;
VII – justificativa de preço;
VIII – autorização da autoridade competente.
Parágrafo único. O ato que autoriza a contratação direta ou o extrato decorrente do contrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial.
[4] Art. 94. A divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) é condição indispensável para a eficácia do contrato e de seus aditamentos e deverá ocorrer nos seguintes prazos, contados da data de sua assinatura:
I – 20 (vinte) dias úteis, no caso de licitação;
II – 10 (dez) dias úteis, no caso de contratação direta.
- 1º Os contratos celebrados em caso de urgência terão eficácia a partir de sua assinatura e deverão ser publicados nos prazos previstos nos incisos I e II do caputdeste artigo, sob pena de nulidade.
- 2º A divulgação de que trata o caputdeste artigo, quando referente à contratação de profissional do setor artístico por inexigibilidade, deverá identificar os custos do cachê do artista, dos músicos ou da banda, quando houver, do transporte, da hospedagem, da infraestrutura, da logística do evento e das demais despesas específicas.
- 3º No caso de obras, a Administração divulgará em sítio eletrônico oficial, em até 25 (vinte e cinco) dias úteis após a assinatura do contrato, os quantitativos e os preços unitários e totais que contratar e, em até 45 (quarenta e cinco) dias úteis após a conclusão do contrato, os quantitativos executados e os preços praticados.