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Sua Empresa Estatal está preparada para detectar fraudes licitatórias e evitar sanções do TCU?

Laranjas
Laranjas

Por: Marcela Oliveira[1]

Supervisão: Felipe Ansaloni[2]

 

I – Introdução

As empresas estatais desempenham papel fundamental na economia brasileira, movimentando bilhões de reais em contratações públicas anualmente. A Lei nº 13.303/2016, conhecida como Lei das Estatais, trouxe um novo regime jurídico para as licitações e contratos dessas entidades, estabelecendo mecanismos de governança e conformidade mais robustos.

Nesse contexto, o Tribunal de Contas da União (TCU) vem consolidando importantes entendimentos sobre a aplicação da referida lei, especialmente no que tange às fraudes em licitações e à tentativa de burlar sanções administrativas. O recente Acórdão 2339/2023 do Plenário do TCU traz relevante jurisprudência sobre a declaração de inidoneidade em casos de confusão patrimonial para fraudar licitações, tema que merece atenção tanto de gestores públicos quanto de empresários.

Este artigo visa alertar os gestores de empresas estatais sobre a importância de implementar mecanismos eficazes de detecção de fraudes licitatórias, a fim de evitar sanções do TCU e garantir a conformidade com a Lei das Estatais.

II – Sua Empresa Estatal está preparada para detectar fraudes licitatórias e evitar sanções do TCU?

 

A transparência e a integridade nos processos licitatórios são fundamentais para garantir a eficiência e a legalidade das contratações públicas. No contexto das Empresas Estatais, a Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) estabelece diretrizes específicas para garantir concorrência justa e evitar fraudes.

Recentemente, o Tribunal de Contas da União (TCU), por meio do Acórdão 2339/2023 – Plenário, reafirmou a possibilidade de declaração de inidoneidade de empresas que tentam burlar as sanções impostas a outras, evidenciando a necessidade de um controle rigoroso por parte dos gestores de Empresas Estatais.

A declaração de inidoneidade é uma das sanções mais graves que podem ser aplicadas a empresas que cometem irregularidades em licitações. Segundo o artigo 46[3] da Lei 8.443/1992 (Lei Orgânica do TCU), a Corte de Contas pode declarar uma empresa inidônea por até cinco anos em casos de fraude comprovada à licitação. A Lei das Estatais, por sua vez, não prevê a declaração de inidoneidade como sanção para as empresas estatais, mas permite a suspensão temporária do direito de licitar (art. 83, inciso III)[4].

O Acórdão 2339/2023 do Plenário do TCU, de relatoria do Ministro Augusto Nardes, estabeleceu um importante precedente ao determinar que é cabível a declaração de inidoneidade, nos termos do citado art. 46 da Lei Orgânica do TCU, para empresa que utiliza o patrimônio de outra organização previamente apenada com suspensão temporária.

A situação analisada pelo TCU envolvia uma tentativa de burlar a vedação prevista no art. 38, inciso II, da Lei das Estatais, que proíbe a participação em licitações de empresas suspensas de licitar e contratar com a entidade sancionadora. Na prática, uma empresa utilizou o patrimônio de outra que já estava impedida de participar de licitações, caracterizando confusão patrimonial e fraude ao certame.

“Responsabilidade. Declaração de inidoneidade. Abrangência. Fraude. Patrimônio. Suspensão temporária. Empresa estatal. É cabível a declaração de inidoneidade (art. 46 da Lei 8.443/1992) de empresa que, com o intuito de burlar a vedação do art. 38, inciso II, da Lei 13.303/2016, participa de licitação promovida por estatal valendo-se do patrimônio de outra empresa (confusão patrimonial) apenada com a sanção de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar (art. 83, inciso III, da Lei 13.303/2016), por caracterizar fraude à licitação.

(ACÓRDÃO 2339/2023 – PLENÁRIO – Relator: AUGUSTO NARDES – Processo: 005.128/2023-4 launch – Tipo de processo: REPRESENTAÇÃO (REPR) – Data da sessão: 22/11/2023 – Número da ata: 48/2023 – Plenário)

A confusão patrimonial ocorre quando não há separação clara entre o patrimônio de diferentes pessoas jurídicas ou entre estas e seus sócios. No contexto das licitações, essa prática pode ser utilizada de forma fraudulenta para permitir que empresas impedidas de licitar continuem participando indiretamente dos certames.

Entre as estratégias comumente identificadas estão:

  • Criação de novas empresas com os mesmos sócios de empresas sancionadas;
  • Transferência informal de ativos entre empresas do mesmo grupo econômico;
  • Utilização de “empresas de fachada” para ocultar os reais participantes da licitação;
  • Compartilhamento de estrutura física, funcionários e recursos operacionais.

Essas condutas não apenas violam a Lei das Estatais, mas também o princípio da moralidade administrativa e a própria integridade dos processos licitatórios.

O Acórdão 2339/2023 inova ao aplicar a sanção de inidoneidade nos casos de confusão patrimonial utilizados para fraudar licitações de estatais, o que amplia significativamente o escopo e a severidade da punição. Enquanto a suspensão temporária prevista na Lei das Estatais limita-se à entidade sancionadora, a declaração de inidoneidade estende seus efeitos a toda a Administração Pública Federal.

A decisão do TCU reforça a necessidade de as Empresas Estatais aprimorarem seus mecanismos de compliancee due diligence, visando prevenir fraudes e garantir a lisura dos processos licitatórios. Além disso, destaca-se a responsabilidade dos gestores em adotar medidas que impeçam a participação de empresas que tentam contornar penalidades aplicadas a terceiros.

III – Recomendações do TCU às Empresas Estatais:

Diante do entendimento firmado pelo TCU, os gestores de empresas estatais devem adotar medidas preventivas e corretivas para evitar a ocorrência de fraudes em seus processos licitatórios:

  1. Implementar verificação aprofundada da composição societária dos licitantes, não se limitando a consultas cadastrais básicas, mas investigando possíveis vínculos societários indiretos.
  2. Criar banco de dados integrado sobre empresas sancionadas e seus sócios, compartilhando informações entre diferentes estatais e órgãos de controle.
  3. Incluir nos editais cláusulas específicas que exijam declaração de ausência de impedimentos e vedação expressa à confusão patrimonial, com previsão de consequências em caso de descumprimento.
  4. Adotar procedimentos de due diligence para identificar indícios de confusão patrimonial, como compartilhamento de endereços físicos, telefones, e-mails ou funcionários entre diferentes empresas.
  5. Capacitar as comissões de licitação e pregoeiros para identificar sinais de alerta relacionados à confusão patrimonial.
  6. Estabelecer canais de denúncia que permitam o recebimento de informações sobre possíveis fraudes nos processos licitatórios.
  7. Aplicar rigorosamente as sanções administrativas quando constatadas fraudes, comunicando os fatos ao TCU e demais órgãos competentes.
  8. Realizar auditorias periódicas nos processos licitatórios, com ênfase na verificação da idoneidade das empresas participantes.

IV – Recomendações da 11E Licitações ao Empresário:

Os empresários que participam de licitações promovidas por empresas estatais também devem adotar medidas preventivas para evitar problemas:

  1. Manter separação clara e formal entre diferentes pessoas jurídicas do mesmo grupo econômico, respeitando a autonomia patrimonial de cada empresa.
  2. Implementar programas de compliance específicos para participação em licitações, com políticas claras sobre vedações legais.
  3. Verificar regularmente a situação cadastral das empresas do grupo em relação a possíveis sanções administrativas.
  4. Evitar a participação simultânea de empresas do mesmo grupo econômico em uma mesma licitação.
  5. Manter registros contábeis precisos que demonstrem a separação patrimonial entre as empresas.
  6. Buscar orientação jurídica especializada antes de adotar estratégias societárias que possam ser interpretadas como tentativa de burlar sanções.
  7. Considerar os riscos reputacionais associados à declaração de inidoneidade, que podem impactar negativamente os negócios da empresa além da esfera pública.

 

V – Comentários do Professor Felipe Ansaloni

           

O Acórdão 2339/2023 do TCU representa um significativo avanço no combate às fraudes em licitações de empresas estatais. A aplicação da declaração de inidoneidade nos casos de confusão patrimonial eleva consideravelmente os riscos para as empresas que tentam burlar sanções administrativas.

Aos gestores de empresas estatais, recomendo a implementação de mecanismos avançados de verificação patrimonial e societária que vão além das simples consultas cadastrais. Desenvolvam metodologias que identifiquem vínculos indiretos entre empresas e criem uma matriz de riscos específica para detecção de fraudes.

Aos empresários, alerto que a separação patrimonial entre pessoas jurídicas de um mesmo grupo econômico deve ser real e substancial. O TCU tem demonstrado capacidade para identificar situações de confusão patrimonial mesmo quando sofisticadamente ocultadas. Revejam seus modelos de gestão, garantindo a segregação efetiva de ativos, funcionários e estruturas físicas.

A constituição de nova pessoa jurídica com estrutura semelhante à de uma empresa sancionada já não é suficiente para escapar do controle. O Tribunal está disposto a “levantar o véu” da personalidade jurídica, e a sanção de inidoneidade, com efeitos em toda a Administração Federal, representa um risco significativo à continuidade dos negócios.

VI – Conclusão

O Acórdão 2339/2023 do TCU representa um marco importante na jurisprudência sobre fraudes em licitações de empresas estatais, especialmente no que tange à confusão patrimonial como estratégia para burlar sanções administrativas. A possibilidade de aplicação da declaração de inidoneidade nesses casos eleva significativamente os riscos para empresas que adotam tais práticas.

Tanto gestores de empresas estatais quanto empresários devem estar atentos a essa nova interpretação, adotando medidas preventivas e corretivas para garantir a lisura dos processos licitatórios. A integridade nas contratações públicas não é apenas uma exigência legal, mas um componente fundamental para a eficiência na aplicação dos recursos públicos e para a própria credibilidade das instituições.

A implementação das recomendações apresentadas neste artigo pode contribuir significativamente para a prevenção de fraudes em licitações, promovendo um ambiente de negócios mais ético e transparente no relacionamento entre empresas estatais e fornecedores privados.

VII – Como citar este texto

 

BARBOSA, Felipe José Ansaloni. OLIVEIRA, Marcela de Sousa. Sua Empresa Estatal está preparada para detectar fraudes licitatórias e evitar sanções do TCU? 2025. Disponível em: www.11E.com.br.

VIII – Palavras-chave

Empresas estatais, Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016), Tribunal de Contas da União (TCU), Acórdão 2339/2023 TCU, Fraude em licitação, Confusão patrimonial, Declaração de inidoneidade, Suspensão temporária, Compliance em contratações públicas, Due diligence, Governança corporativa, Sanções administrativas, Contratação pública, Integridade nos processos licitatórios

IX – Observação:

Este artigo tem caráter meramente informativo e geral. O seu conteúdo não substitui a consulta a profissionais especializados em Consultoria e Assessoria em Licitações e Contratos Administrativos, especialmente para a avaliação de casos concretos. Recomenda-se que as Empresas Estatais busquem orientação jurídica especializada e casuística, antes de realizar qualquer contratação. A 11E Licitações, empresa especializada no segmento de consultoria e treinamentos, pode auxiliar a sua empresa estatal. Entre em contato conosco pelo: contato@11e.com.br ou whatsapp: (31) 3568-8311.

[1] Analista da 11E Licitações.

[2] CEO e Professor da 11E Licitações.

[3] Art. 46. Verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação, o Tribunal declarará a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na Administração Pública Federal.

[4] Art. 83. Pela inexecução total ou parcial do contrato a empresa pública ou a sociedade de economia mista poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade sancionadora, por prazo não superior a 2 (dois) anos.